segunda-feira, 24 de maio de 2010

THE QUICK BROWN FOX JUMPS OVER THE LAZY DOG


Quando Gutenberg deu início a possibilidade de imprimir um livro tipográfico, lá pelo século XV, com seus tipos feitos de chumbo, antimônio e estanho, o conhecimento disponível à humanidade dava um largo passo. A chance de um livro não depender mais da falta de pressa dos escribas abria um caminho à disseminação do saber, fosse este qual fosse, que evolui até hoje nas wikipédias da vida. Porém com o tempo e com uma maquinaria mais sofisticada, os tipos móveis foram caíndo em desuso. Fábricas e fábricas foram fechando, deixando seus tipos para colecionadores e afins. Hoje, no Brasil, acredito eu, apenas a Gráfica Fidalga ainda está na ativa. O que é uma pena. A impressão em tipos móveis é barata, não polui (ouk, se pegarmos na raiz das coisas, polui bem menos), elegante e diferente de tudo o que se vê por aí. É ímpar, é único. Cada cartaz possui um traço característico só seu, embora todos possuam a mesma impressão. E é exatamente neste lamento que eu incentivo a todos e todas que façamos uma retomada deste austero e rudimentar sistema de impressão. Façamos tipos móveis! Abramos, cada um, uma Gráfica de Tipos Móveis em sua própria casa! Dominemos o mundo com tinta tipográfica e papel jornal!... Não? Só eu? Ouk, enfim. Para quem interessar, segue abaixo um passo-a-passo bem simples de como podemos fazer tipos móveis de uma maneira prática e barata.

O que precisa:

- Goivas (o conjunto com seis está à venda na Koralle (José Bonifácio, 95) por R$29)
- Borrachas (os tipos que eu apresento aqui foram feitos com borracha, mas podem ser feitos também com madeira ou linólio)
- Fósforos
- Estilete
- Nanquim (recomendo, para quem estiver mais legal de grana do que eu, comprar Tinta Tipográfica, um ponte de 1L de tinta preta sai em torno de 30 reais e dura uma eternidade)
- Papel Vegetal
- Lápis (4B ou 6B, de preferência)
- Pincel Pequeno

Então. Escolha uma fonte tipográfica de sua preferência e reserve. No caso aqui, eu usei um borrachão da mercur, mas recomendo uma borracha que não esfarele, o tipo fica talhado mais precisamente em uma dessas. Com o borrachão da mercur dá para fazer 4 tipos: corte ela ao meio na vertical e depois divida cada parte em duas fatias. É nessa hora que entra o estilete e os fósforos: esquente o estilete e corte a borracha, assim, o corte fica mais liso. É bem importante também que as fatias sejam cortadas na mesma altura para que, na hora de fazer a composição dos tipos lado-a-lado, os tipos saiam impressos corretamente. O espacejamento entre letras é feito a partir do corte lateral da borracha. Recomendo que o kerning seja a última coisa a ser feita.


No caso do borrachão da mercur, se cortado da forma que eu descrevi acima, teremos 4 fatias de borracha, cada uma com a superfície de 35x50mm. Com esta medida, faça no computador retângulos e coloque a fonte tipográfica de sua escolha dentro deles. Eu usei a Frutiger LT Std 45 Light, com 104pts. Imprima o PDF (não esqueça de marcar a opção de tamanho original na hora de imprimir, sempre se perde uns 5mm em "adaptar para a folha"). Com os tipos impressos, corte um pedaço de papel vegetal e desenhe por cima, na parte fosca, contornando a letra. É bacana também desenhar as arestas do retângulo, para que, na hora de colocar em cima da borracha, a letra fique bem centralizada.
Pressione o lado desenhado em cima da borracha. Pode usar o cabo do lápis para fazer pressão. Lembrando que no exemplo eu usei as letras "A" e "D", que funcionam de qualquer lado (no caso do "D", é só virar horizontalmente), mas se a letra feita for um "S", espelhe-a na hora de imprimir do computador, porque quando ela for impressa pelo tipo móvel no papel, ficará virada.

Agora, como já diria meu avô sobre seus bichinhos talhados em madeira, tudo o que não for porco ou cavalo vai fora: tudo o que não for a letra, deve ser talhado. Recomendo as goivas "C" e "V" pequenas para talhar, são mais precisas nos detalhes. Para talhar curvas, melhor a goiva "C". Se o tipo for de hastes retas, como o "A" do exemplo, utilize a goiva "V" pequena e o contorne, levando a goiva sempre até o fim. Assim, as chances de o tipo saírem bem retinho são maiores.

Beleza, temos o tipo já. Agora, vamos para a tinta. Quem for rico milionário e usar tinta tipográfica, é o seguinte: use bem pouca, coloque numa superfície lisa (de preferência um metal ou uma pedra) e tenha em mãos um rolo de plástico, desses mais macios. Amacie bem a tinta com o rolo, não deixe formar montinhos. Como a tinta é dura, força no braço, meu amigo! Agora se você estiver bem capenga que nem eu, pegue seu nanquim que venceu em 2009 e bote em uma base, espalhe-o bem com um pincel para que não acumule tinta.
Pressione o tipo móvel contra a tinta espalhada. Tchãrãn, aí está. Agora, coloque-o sobre uma base lisa e pegue o suporte onde será feita a impressão. Recomendo papel jornal, é muito barato e é o que melhor absorve. Pressione o papel jornal sobre o tipo, pode usar uma borracha e fazer um "sanduíche" para auxiliar na pressão.


Puxe o papel e, rufem os tambores, está feita a impressão! Com os tipos lado-a-lado, fica mais fácil de calcular um kerning bacana. Eu faço o kerning de olho, mas se alguém for pilhado o suficiente de dividir a altura do A por 35, recomendo que o faça na hora de imprimir do computador mesmo.

O tipo de borracha pode durar umas 100 impressões para mais, não sei ao certo. Talvez dure 1000, talvez não. Nenhum meu chegou ao seu prazo de validade ainda. Porém, claro, os de madeira e linólio duram mais, sendo a única questão é que a madeira é mais difícil de talhar e o linólio é mais difícil de conseguir e moldar. Se alguém tiver alguma dúvida ou uma sugestão, só me mandar um emeio: silpont@hotmail.com.
Bueno, that's all, folks.