terça-feira, 19 de abril de 2011

gentileza gera gentileza, parte dois

Se tem algo que não canso de repetir, é como eu nos acho engraçados. Quando digo nós, digo da maneira mais genérica possível assim, nós, meliantes seres humanos desse mundão azul. Somos pedaços de carne que trupicam na calçada e se trancam fora do apartamento sem querer. Batem a cabeça na prateleira aérea e fecham o dedo no porta-malas do carro. Erramos diariamente, e me pergunto onde, e quando, realmente erramos. Fazemos essa idéia de que os extraterrestres são seres mega evoluídos a nos observar através de máquinas ultra sofisticadas porque, de alguma forma, sabemos que erramos, sabemos que ficamos para trás. Temos esse inconsciente de que se há algo além, esse algo com certeza não deixa o celular cair na vaso sanitário.
Quando observo meu gato emitir barulhos estranhíssimos e se jogar contra as paredes do corredor, me pergunto se foi eu quem errou ou se essa já era uma informação que contava na predisposição genética dele. Acredito, prefiro acreditar!, que já somos pré-programados para certas coisas. Porém, também somos extremamente maleáveis.
Esses tempos, trabalhei na monitoria de um festival de fotografia. Durante este festival, para uma oficina, seria necessário um aparelho de data-show. Fiquei sabendo disso uma hora antes da tal oficina acontecer. Beleza, fui conferir no local onde nos emprestaram uma sala se não poderiam nos emprestar um data-show também. Qual não foi a minha surpresa quando, ao questionar se haveria a disponibilidade, a moça que trabalha no estabelecimento gentilmente perdeu o controle de si. Disse que era uma irresponsabilidade, um descaso, um desacato, uma afronta, um horror, um abuso, um absurdo, e, por que não?, um crime hediondo eu estar requerindo aquilo àquela hora. Ele teria que ser solicitado com um mínimo de 24 horas de antecedência. Sem mais. Ouk, algumas dessas coisas eu inventei, mas é só porque não lembro ao certo o que ela disse e, também, porque curto ilustrar bem os causos com palavras.
Enfim, o fato foi que a mulher perdeu as estribeiras por muito pouco. Eu ali, no auge da minha boa vontade, ainda fazendo a digestão e também meio de cara por ter sido informada só naquele instante de que seria necessário um data-show, resolvi fazer o que faço de melhor. Fiz alôka. Ensaiei a melhor cara de "segura e amarra teu tchan aí" e discursei, com muita candura, sobre como ela estava certa, sobre como eu estava errada e sobre como, se disponível estivesse, eu poderia ter acesso ao data-show por apenas algumas horas, mostrando perfeito conhecimento das burocracias e regras que estaria violentamente burlando. Foi como se eu estivesse ofertando lírios originários dos mais suaves campos do hemisfério norte à ela. Mudou completamente de tom. Foi gentil, se desculpou, falou algo sobre não ter almoçado direito e me conseguiu o tal do artefato projetor de imagens.
Silvia 1 x 0 Vida.
Nessas horas, percebo como pode ser fácil contornar nossas predisposições. Nosso jeito atrapalhado de ser apenas delata a nosso favor. Temos mil defeitos, mas, ainda assim, vivemos muito bem, obrigada. Claro que sempre tem os loucos por essência, e não por esporte (como disse um amigo certa vez), mas essas fatalidades acontecem. A maioria das pessoas se faz, não faz de propósito, faz porque erra e errar é humano. Gentileza gera gentileza e estupidez gera treta, temos que saber elaborar bem nossas opções e a vida terá uma tendência maior à tranquilidade.